terça-feira, 16 de outubro de 2012

Autismo e Políticas Públicas




No dia 4 de setembro de 2012 foi aprovado no Plenário da Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 1631/11 do Senado que cria a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. Estima-se que haja 2 milhões de autistas no Brasil. É a primeira vez que temos uma política que trata dos direitos dos autistas e obrigações do poder público para com eles.

No entanto, vemos cada vez mais políticas específicas no campo da saúde mental. Essa tendência traz implicações não só para a prática nesse campo como também para a formação de profissionais. É só imaginar que com cada política específica de um determinado transtorno teremos uma nova direção de prática e tratamento a seguir, contribuindo assim, para uma fragmentação no campo da saúde mental. Já em relação à formação dos profissionais que atuam nessa área, os cursos teriam que dar conta dessas novas demandas de políticas públicas, o que refletiria no currículo e na duração dos mesmos. 

O projeto de lei que cria a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista foi elaborado a partir de sugestão da Associação em Defesa do Autista (Adefa). Em seu site, a Adefa diz sobre o autismo: “[...] apesar da multiplicidade de estudos existentes e de se reconhecer que apresentam uma causa biológica bem demonstrada, continua ainda por definir qual a etiologia precisa que desencadeia um quadro clínico de autismo. No entanto, parece ser consensual que esta perturbação evidencia uma origem multifatorial, devendo ser considerados fatores genéticos e ambientais [...]".

O que temos aí com essa noção de etiologia que norteia uma futura política nacional é o privilégio por um tratamento cognitivo-comportamental, uma vez que noções distintas acerca da etiologia levam a direções distintas de tratamento. Calazans e Martins (2007) demonstram como a terapia cognitivo-comportamental se pauta na noção de transtorno para definir como finalidade do tratamento a adaptação do sujeito a ordem social, ao passo que os sintomas autistas, nessa perspectiva, são tomados como déficits, um impasse a normalização. Já pelo olhar psicanalítico, o tratamento deve, em contrapartida, partir justamente desse sintoma que revela uma posição subjetiva do sujeito.

Nas diretrizes dessa política nacional estão contemplados: a inserção social dos autistas através do estímulo à entrada no mercado de trabalho; o acesso a ações e serviços de saúde, com vistas à atenção integral, como por exemplo, o acesso a atendimento multiprofissional e a medicamentos e a obrigatoriedade da inclusão dos autistas nas escolas de ensino regular. 

Esboçamos aqui uma grande preocupação: como irão se operacionalizar essas diretrizes/ações? No caso das escolas regulares, por exemplo, que serão obrigadas a incluir pessoas com autismo em suas classes, sabemos que tal ação não é tarefa fácil. Basta ver como exemplo os obstáculos para a inclusão de pessoas com deficiência em escolas regulares. Tais diretrizes apresentam o que fazer, mas não o como fazer. 

A comoção pública para a aprovação do projeto de lei é grande. Existe um abaixo-assinado exigindo que o PL seja sancionado pela Presidência o mais rápido possível. Até o presente momento, salvo engano, não temos nenhuma manifestação do Conselho Federal de Psicologia a propósito de tal projeto de lei. 

Caso essa Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista seja aprovada, podemos visualizar como uma consequência, a criação de diversos cursos de especialização para tratar dessa demanda. O que nos preocupa aqui, como já demonstrado anteriormente, é a direção de tratamento que será destinada aos autistas no Brasil.

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